10 setembro 2012

24 - Pescaria


Depois daquela limpeza 'espiritual' dos dois, Phillip levou Carolina para casa. 
Pedira desculpas a ela, dizendo que queria chegar em casa para tomar um bom banho, deitar em sua cama e dormir. Queria esquecer uma parte daquele dia. Carolina o entendeu muito bem e não o questionou. Também queria um tempinho só para si. No dia seguinte iriam se encontrar e planejar algo para fazerem.
E esse dia chegou.
Phillip acordou cedo e bem disposto. Fazia calor e o sol dava as caras. Desceu para tomar seu café da manhã e encontrou seus pais já sentados na mesa desfrutando o desjejum.
- Oi, família! - falou Phillip disposto.
- Que bom que está disposto, meu filho, depois de ontem! - falou Elena.
- Ah, mãe! Hoje é outro dia e não vou ficar remoendo o passado. Deixa eu me preocupar agora em conseguir mais clientes para empresa, em escolher um passeio para fazer com Carol e com vocês! - falou Phillip.
- Isso aí, meu filho. Acho melhor você se preocupar com o café da manhã, porque, se demorar muito, já era! - falou Constantin.
- Isso é que não pode! - Phillip foi logo tratando de atacar uma broa de milho.
O celular de Phillip toca logo depois que ele coloca a caneca na pia e vai atender. É Carolina.
- Oi, amor, estava indo mesmo ligar para você! 
- Estamos em sintonia! Tudo bem? - perguntou Carolina.
- Melhor agora... O que está fazendo?
- Vou fazer agora. Estou te convidando a vir pescar... Quero dizer, estamos te convidando a vir pescar conosco! - falou Carolina, sendo interrompida por Miguel para dizer que todos estavam convidando Phillip.
- Pescar? - perguntou Phillip surpreso.
- Sim! Pescar, amor, você nunca fez isso?
- Nunca! E já estou indo para aí! - despediu-se Phillip.
Phillip vestiu uma camisa, uma bermuda jeans, tênis, colocou seus óculos escuros e foi. 
Chegou à casa de Carolina, tocou o interfone e prontamente foi atendido. Pediu para que Phillip subisse e esperasse dentro de casa. Ele respirou fundo, ajeitou o penteado no espelho do hall e tocou a campainha.
- Oi! Você que é o Phillip? - perguntou Miguel ao recepcioná-lo.
- Em carne e osso e mais um pouco - respondeu Phillip.
- Então você é o Capitão América! - falou Miguel!
- Hahahah - riu Phillip.
- Maneiro!!! Carol está na cozinha! Carooooooool - gritou Miguel.
- Oi, amor!
Phillip e Carolina beijaram-se, enquanto Miguel espiava os dois.
- Vai chamar o papai, anda! - ordenou Carolina a Miguel.
- Paiiii, o capitão América está aqui! - gritou Miguel dali mesmo. 
Os namorados olharam-se e começaram a rir. O pai, um homem de estatura baixa, com um corpo ainda forte e uma barba curta grisalha, veio em seguida e olhou atentamente para Phillip, ajeitando os óculos de grau.
- Imaginei você diferente! - falou Júlio a Phillip.
- É? Como? - perguntou curioso.
- Sei lá, ruivo, cheio de sarda, comprido e magrelo. Não é esse o estilo americano? - brincou o pai.
- E falando americano! - completou Miguel.
- Falando em inglês americano, Miguel! - falou Carolina.
- Mas ele não é americano? - perguntou confuso Miguel.
- Mas o inglês americano é uma forma da língua inglesa, derivada do inglês britânico. Fala-se inglês americano nos Estados Unidos e inglês britânico no Reino Unido - explicou Carolina.
- Ai, não entendi nada! - falou emburrado Miguel.
- Mas, na verdade, não sou americano e nem inglês, eu nasci no Brasil, meus pais é que são americanos! - explicou Phillip.
- Ah! Não importa! Deixa isso pra lá! - falou Júlio.
- E na verdade, seu Júlio, sou mais bonito que esse rapaz aí que imaginou! - riu Phillip.
- É sim, estou brincando, vem cá, rapaz! - falou Júlio abrindo os braços esperando o abraço de Phillip.
- Bem, então vamos, né? - falou Carolina apressada.
- Vamos! Já peguei tudo. Pegou a câmera? - perguntou Júlio a Miguel.
- Já tá na bolsa, pai!
Desceram para o carro, Phillip ajudou a carregar uma cesta de palha para o piquenique e Júlio, a cesta de apetrechos de pescaria, enquanto Carolina carregava uma garrafa térmica com água.
Phillip foi correndo até seu carro para pegar um jogo de baralho e quando Miguel viu o carrão de Phillip, ficou louco.
- Pai! Eu quero ir no carro do Phillip, posso?
- Meu bem, nós vamos no carro do papai, todos juntos.
- Ah, não, Carol, por favor, vamos no carro do Phillip, nunca andei naquele carro!
O pai ficou rindo de Miguel, observando o escândalo que ele fazia. Balançou a cabeça e falou:
- Você pode ir no carro do Phillip, mas só se souber dirigir! - falou Júlio.
- Ah, pai! - falou Miguel desapontado.
Phillip olhou para Carolina com olhar de "deixa o garoto, vai!". 
- Então, tá bom, você venceu, vamos no carro do Phillip. Pai, vai ser até melhor, o carro dele tem mais espaço para as tralhas da pescaria e do piquenique. - falou Carolina amenizando o problema.
- É, também estou achando, vamos nessa, também quero ser chique por um dia! - falou Júlio.
O carro do Júlio era pequeno, tinha há muito tempo e mesmo assim ainda era muito útil. Ele era muito zeloso com suas coisas.
O grupo acomodou-se no carrão de Phillip. Estavam todos aconchegados no fresquinho do ar-condicionado.
O percurso era distante, levaram um pouco mais de cinquenta minutos para chegarem, mas valeu a pena. Estavam saindo de uma cidade urbana para uma rural, onde se viam muitas casas com cercados, pastos, alguns restaurantes de beira de estrada e vendedores já posicionados estrategicamente esperando a sorte de venderem suas bananadas.
Estacionaram o carro logo na entrada do lugar que tinha um estacionamento próprio para os pescadores. O local era coberto por verde com belas árvores de todas as espécies, um roseiral bem tratado que ficava em um cercado com uma entrada em forma de arco e logo depois se via um grande lago de cor escura e verde. O lugar não era abandonado, parecia um clube. Havia um restaurante no local em que os pescadores se reuniam depois da pescaria. O grupo andou por um caminho de pedras, até encontrar um lugar apropriado. O lago criava um formato oval e na beira, vários banquinhos de cimento para os pescadores sentarem. Alguns levavam a família para fazerem piqueniques. 
Alguns pescadores preferiam pescar em pequenos barcos, enquanto uns já exibiam seus peixes, outros ainda estavam na tentativa.
Miguel escolheu um lugar que ficava na curva do lago. Carolina estendeu ali uma canga preta e branca, colocando algumas frutas e guloseimas. Phillip repousou o garrafão de água e perguntou se alguém queria um gole. Júlio se ajeitou no banquinho com seus apetrechos de pescaria, observado por Miguel e Phillip.
- Lugar bonito, hein, seu Júlio? Parece que estamos no Pantanal! - falou Phillip.
- É realmente um lugar muito bonito. Às vezes fico pescando e esqueço um pouco da vida. Olha aquele horizonte!
Os quatro observaram quase que instantaneamente o horizonte, um fio cortando o grande lago e um céu extremamente azul, com pouquíssimas nuvens. O contraste do céu azul, com o lago bem verde fazia uma bela pintura. O sol batia suave. O verão não tinha chegado ainda e a temperatura estava agradável.
- Geralmente chego mais cedo aqui. O pessoal começa a chegar às 6 horas da manhã. - falou Júlio.
- Aqui é um clube? - perguntou Phillip.
- É sim. Um sítio que virou um clube de pesca. Todos que vem aqui são cadastrados. Pagam uma pequena quantia por mês e você pode levar os peixes para vender ou para fazer uma boa refeição em casa. - explicou Júlio.
- Meu pai adora pescar, mas na realidade ele não pesca, ele se ilude - riu Carolina.
- Como assim? - perguntou Phillip.
- Ele vem aqui por pura diversão, ele pesca o peixe, dá uma olhada nele, se for grande, tira foto e devolve ao rio. Meu pai tem dó dos peixes... - falou Carolina.
- Também não é assim. Já levei diversas espécies de peixe para casa, só levo para casa o que consigo pegar, os pequeninos eu devolvo mesmo e não levo muitos, um ou dois. E também venho porque Miguel sempre gostou do passeio. - falou Júlio. 
- Eu adoro esse lugar mesmo, quero ser um grande pescador como o papai! - interveio Miguel.
- Será um grande pescador em sua folga do trabalho e quando tiver uma família para mostrar. Esse é o grande diferencial, ter alguém para ver suas conquistas - falou Júlio orgulhoso do interesse do filho.
- É o encontro de pai e filho. - falou Phillip.
- É isso mesmo. É o momento só deles! E, hoje, nós viemos de bagunça mesmo. - falou Carolina a Phillip.
- Venho sempre, mesmo quando Miguel não quer. Tenho muitos amigos aqui. Fiz boas amizades.
- O senhor já pegou quais peixes? - interessou Phillip.
- Ahhh, meu rapaz, não peguei todos os que gostaria, mas Dourado, Tilápia, Piau e Corimbatá já foram servidos em nossa humilde residência! - falou Júlio orgulhoso.
- Eu não entendo muito de peixes... - falou um Phillip desapontado.
- É uma coisa que você vai aprendendo aos poucos, o Miguel conhece alguns, mas se ele ficasse mais paciente em pescar, talvez conhecesse mais os peixes e algumas dicas.
- Ele não para um segundo! Miguel está sempre em movimento! - riu Carolina.
Enquanto isso, Miguel estava correndo com outros amiguinhos a procura de algum bicho ou de alguém para se juntar as brincadeiras.
- E também, meu rapaz, tenho esperanças de pescar uma sereia! - falou Júlio por fim.
- É, não custa nada, Seu Júlio. Caiu na rede é peixe! - e riram todos.
Não demorou muito e com muita luta, Júlio pescou um peixe. Era um Tucunaré, de proporção média e parruda, deixando todos felizes. Carolina gritou por Miguel, enquanto Phillip buscava alguns copos de plástico para brindarem com vinho, o peixe. Miguel bebeu suco de uva.
Júlio pediu a um amigo que tirasse uma foto dele com o peixe, juntamente com sua família. Foi uma foto que ficou em um belo porta retrato na sala, presenteado por Carolina ao pai. 
- Vamos! Vamos para casa preparar esse peixe! - gritou Júlio para os demais.
- Mas, já, pai? Ainda nem comemos os bolinhos de café! - falou Carolina.
- Então tá. Vou ver se consigo pescar mais algum. Phillip está me dando sorte! 
- Estou é? Então, estou aprovado na família!? - perguntou divertido Phillip.
- Eu não falei isso. Esse é outro assunto. - riu Júlio! - Vou pescar outro peixe para você levar para a sua casa, combinado? 
- Combinado, seu Júlio! Minha mãe vai gostar, ela adora peixe.
Enquanto esperavam Júlio pescar outro peixe, Miguel e Phillip se divertiam com o carteado. Phillip estava ensinando Miguel a jogar buraco e Carolina observava os dois. 
Demorou um pouco, mas Júlio pescou o último peixe do dia; um Dourado. E então, eles foram embora. Júlio estava louco para saborear um Tucunaré. Tratou de embalar o Dourado apropriadamente para que Phillip entregasse a sua mãe e seguiram em direção ao estacionamento, fazendo o mesmo percurso da chegada e admirando o lugar, com suas montanhas altas e bem verdes.
Colocaram as tranqueiras no porta-malas e Miguel segurou no colo o garrafão de água que ainda estava cheio, logo desistindo, reclamando do peso. 
Miguel olhava para a janela da Land Rover feliz da vida, pois adorara ter conhecido Phillip. E ver a irmã feliz o deixava feliz também, fora que Phillip era legal com ele e podia ter um irmão, desejo que Miguel e Phillip sempre tiveram.
- E aí, rapaz, feliz pelo dia de hoje? - perguntou Phillip.
- Muito! O dia mais feliz da minha vida! - exagerou Miguel.
- Exagerado! Mas eu sei como o Miguel é, ele gosta de estar junto com a galera. - falou Carolina.
- Só não gosto de ficar sozinho! E sempre quis ter um irmão! - falou envergonhado Miguel.
- Pode apostar, Miguel, também queria um irmãozinho, agora que já tenho, vou te irritar até você pedir arrego a sua irmã! 
- Duvido! - berrou Miguel.
- Bem, só depois de Carol preparar o almoço! - falou Phillip.
- Que nada, amor! Quem prepara o peixe é o papai. Ele nem me deixa pegá-lo. A cria é dele, ele quem prepara! - riu Carolina.
- Não sabia que o seu Júlio cozinhava! 
- Viu? Mais um motivo para você deixar a preguiça de lado e aprender. Quem sabe papai não te ensina alguns truques na cozinha?
- Me sinto envergonhado agora! Sou um zero à esquerda! - falou Phillip.
- Quando chegarmos, você vai me ajudar na cozinha! - ordenou Júlio. - Filha, tem outro avental?
- Sim! Comprei especialmente para a ocasião!
- Então, quer dizer que foi de caso pensado? - perguntou surpreso Phillip.
- Claro! Convidamos você justamente para ser nosso cozinheiro particular! - falou Miguel, fazendo com que todos rissem.
A Land Rover fazia o seu trajeto, com música boa e companhias divertidas, em um visual rústico com casebres coloridos ao fundo, deixando à vista bois e vacas pastando. Alguns cavalos corriam em busca de um lugar para o seu sossego. Pareciam que estavam em outro mundo, um mundo sem aquela agitação da cidade, um mundo em que as pessoas não tinham pressa em fazer de sua vida um simples momento de existência, dando valor a cada pingo de chuva nas plantações, a cada cria que nascia para dar-lhes o sustento, ao sol que fazia o seu papel, nutrindo as plantas e dando brilho àquele lugar e ao vento que colocava tudo em ordem. 
Aquelas pessoas eram felizes do jeito mais simples. Viviam o presente, sem luxo e ainda assim tinham orgulho de sua vida no campo. Muitos deveriam aprender com eles.


Nenhum comentário:

Postar um comentário